Senhora dona Dalinha
Ouvi falar do seu galo
Quem falou é seu amigo
Mas seu nome eu não lhe falo
Que é pra não dar
confusão.
Prezo a irmã e o irmão
E é por isso que eu me
calo.
Muita estória me contaram
Mas só falando vantagem.
Ninguém quer sair
perdendo
Vem logo com fuleragem
Mas acredito que galos
Gostam mesmo é dos
embalos
Com galinha em vadiagem.
Soube até que não tem
galo
Melhor do que o galo seu.
Que o bicho é inteligente
E com ninguém aprendeu.
Cisca bem no seu terreiro
Papa todo o galinheiro
E inda é melhor do que o
meu.
Eu vou contar pra esse
povo
O que um dia aconteceu
Que por fazer muito tempo
A senhora já esqueceu.
Dessa vez conto e não
corro
Nem pro mato nem pro
morro
Pois veja o que sucedeu:
Eu mesmo um dia vi na rua
Um corre-corre e alvoroço
Tinha uma rinha de galo
Dos pelados no pescoço
E alguém gritou: lá na
rinha
Tem um galo de Dalinha
Massacrando um galo moço!
Quando olhei, vixe Maria,
Vi levantar a poeira
Vi um galinho de briga
Na sua luta derradeira!
Contra seu galo, Dalinha,
Qualquer um perde na rinha
E eu num tô de
brincadeira.
Dali, dobrando a esquina,
Encontrei o Zé Vicente
Conhecido no sertão
Por ter um galo valente
Chamado galo gigante
Pouco menor que elefante
Que em vez de bico tem
dente!
Falei: não tem serventia
Me diga pra que que serve?
Ele pegando um tição
Disse: é ali que a água
ferve
E é bem aqui na cozinha
Que o tal galo de Dalinha
Vai ser ator da sua verve.
Meu galo morde, não bica
E é bem maior do que o
dela
O dente dele é afiado
Vai direto na titela
Corta as asas e o pescoço
Faz dele frango sem osso
E manda aqui pra panela!
Rapaz não brinque com
isso
Retruquei de imediato.
É casa de marimbondo
Eu lhe garanto que é fato
Pois o galo de Dalinha
Come o pirão e a galinha
E limpa o bico em seu
prato!
Isso é conversa fiada
Isso é história de
trancoso.
Respondeu o Zé Vicente
Um cabra réi perigoso.
Não tenho medo de vaca
Nem de espingarda nem
faca
E tô sendo é generoso.
Depois dessa eu fui pra
casa
Arejar o pensamento
Deitei lá na minha rede
Co’as ‘ideia’ em
andamento
Pensando naquele galo
Chega atrapalhava o
embalo
Da rede a todo momento...
Voltei lá e fui correndo
Pois do céu chuva já
vinha
Vi caminho de saúva
No chão aquela estradinha
Corri tanto até chegar
Pois tinha que avisar
À minha amiga Dalinha
E a senhora, educada,
Ficou muito agradecida
Mas disse: diga a esse
moço
Que desde que fui nascida
Nunca fugi de peleja.
Que ele faça o que deseja
E dê adeus a sua vida.
Dizendo isso ela foi
Até o batente da sala
Apontou para uma enxada
Suja de barro, e uma vala
Disse: vou fazer u’a cova
Para encher depois da
sova
E do estampido da bala!
Nunca mais eu vi o cabra
Que mexeu com o galo dela
Nem urubu sabe dele
Seu galo foi pra panela
Comido por todo mundo!
Pra Zé Vicente, o imundo,
Não acenderam nem vela!